Juventude da AE: Duas décadas depois

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Por Daniel Damiani

Dois mil e treze marca os 20 anos da produção de um documento que é referência para a Juventude da Articulação de Esquerda (JAE). Elaborado para um encontro estadual da JPT, em 1993, o texto “O PT e a juventude, política e concepção” foi escrito, pelo, hoje, professor Paulo Denisar Fraga em conjunto com outros companheiros.

A primeira vez que tomei contato com o texto foi em uma Conferência Estadual da JAE-RS, em 2002, em Santa Cruz do Sul. Antes disso, já tinha tomado contato com a sua política numa atividade de organização da JPT na cidade de Vacaria no mesmo ano, onde o então secretário estadual da JPT, Adriano Pires, iniciou o debate de organização perguntando: o que é juventude? A política daquele “manifesto” foi por onde começamos o debate, problematizando, desconstruindo e reconstruindo as diversas concepções de juventude que povoam o senso comum.

Assim, faz 20 anos que enfrentamos a ideia de que juventude é apenas uma questão de “estado de espírito” e buscamos estudar e compreender as especificidades destes que atravessam um momento particular de transição da infância e da idade adulta, que não é uma faixa etária estanque, que cada um e cada uma vive de forma diferente a sua juventude e que as Políticas Públicas convencionaram como etapa que vai dos 15 aos 29 anos.

Preocupamo-nos em desconstruir a imagem de uma juventude naturalmente rebelde ou mesmo o seu oposto, os discursos sobre uma geração acomodada frente a outra supostamente mais revolucionária. Vemos assim o potencial da juventude, mais ou menos como diz Karl Mannheim, os recursos latentes de uma sociedade que podem ser mobilizados para fins progressistas ou conservadores.

Desconstruímos também a ideia que a juventude é um problema, uma filha maldita do capitalismo, um mal que se cura com o tempo. Ao contrário vemos o grande potencial de organização da juventude e como ela pode expressar de forma particular a contradição entre o potencial criativo dos seres humanos e os bloqueios que são impostos em uma sociedade em que as oportunidades são para poucos.

E ao fazer essa reflexão também fomos levados a refletir sobre a nossa própria organização e a relação com o partido e a sociedade.

O texto de 1993 faz uma forte crítica à forma como as organizações tradicionais da direita e da esquerda tratavam de forma utilitarista as suas organizações de juventude. Também, apontava que a nossa política não podia se resumir a “táticas para atrair os jovens para o partido”, que a juventude não podia ser a “setorial dos desocupados do partido” nem ser apenas mobilizada pelos adultos para tarefas como pichar muros, panfletar e balançar as bandeiras do partido.

Nascia assim uma organização de juventude que sempre buscou a sua autonomia, que sempre debateu e refletiu sobre a sua organização, que soube fazer crítica e disputar espaço no partido e mesmo na tendência, que sempre se esforçou por imprimir uma política de juventude na sua intervenção.

Os frutos de tudo isso, pelo que pude acompanhar foram as várias gestões consecutivas que tivemos na JPT-RS, desde Raquel Vercelino, Adriano Pires, Pedrão Vasconcellos e Maurício Piccin. E, lá se vão 15 anos.
Um ponto importante desta história foi quando em 2005, elegemos o Pedro Vasconcellos secretário Estadual da JPT do Rio Grande do Sul e elegemos o companheiro Rafael Pops Secretário Nacional da JPT. Fizemos uma grande gestão, que fez muita relação internacional, jornada nacional de formação política, colocou a JPT em outro patamar, tanto que, em 2007, mobilizamos toda a JPT para garantir no III Congresso Nacional do PT a convocação do I Congresso da JPT, com o objetivo de transformar a JPT em uma organização de juventude, com relativa autonomia. Para além do modelo setorial, dizíamos que a JPT tinha que ser para a juventude o que o PT era para a sociedade.

E então a nossa política se tornou resolução nacional do partido e ganhou muito mais caldo e conteúdo.

Naquela resolução refletíamos que o PT nunca precisou se preocupar com a organização da juventude que espontaneamente construiu e tinha referência no partido, mas que os resultados das eleições de 2006 demonstravam que o PT precisava apostar estrategicamente na renovação partidária, no diálogo com as novas gerações.

Infelizmente fomos derrotados no I Congresso da JPT em 2008. O bloco majoritário eleitoralmente no congresso era acompanhado por representantes da direção partidária que temiam a discussão da autonomia da JPT, temiam que a “esquerdalha” do partido se utilizasse da juventude para fazer disputa no partido mais à esquerda. Tivemos várias vitórias, que podem ser medidas pelas resoluções, pela legalização da maconha, pelo fora Hélio Costa (então Ministro das Comunicações), mas fomos derrotados na resolução sobre “autonomia financeira da JPT” e perdemos a eleição para Secretaria Nacional. A despeito do quadro eleito, Severine Macedo, que vinha de uma militância orgânica nos movimentos de juventude da Agricultura Familiar, operou-se uma restauração conservadora na JPT.

Às vésperas do II Congresso da JPT sofremos um importante racha nas fileiras da nossa corrente, o que não nos impediu de manter uma intervenção na média de tamanho das outras forças da JPT, mas que limitou nosso horizonte político naquele congresso em manter a nossa presença política e fomos muito bem representados com a candidatura do companheiro Bruno Elias.

Podem ser medidos alguns avanços na política de juventude do Partido, a mais significativa não foi uma proposta da juventude, foi a aprovação da cota de 20% de jovens em todas as instâncias do partido a partir do PED deste ano. Mas, no geral, as nossas pautas e desafios continuam mais atuais do que nunca. O PT sob forte ataque da direita através dos seus porta-vozes da mídia não consegue superar a sua dificuldade com as novas gerações. Não se pode dizer que o partido tenha um investimento estratégico na juventude, tão pouco se pode ver por parte da juventude uma postura mais ativa. Ainda assim nas ultimas eleições tivemos um grande número de candidaturas de juventude, o que nem sempre reflete em militância orgânica ou maior organicidade.

Estamos perdendo um tempo precioso em que a JPT deveria pautar com maior atividade as lutas da juventude no país. Ao contrário, a JPT parece cada vez mais incapaz, assim como o partido, de realizar atividades de mobilização e de disputa de hegemonia.

A realidade hoje é que a JPT age como uma frente pouco eficiente, onde a própria força majoritária, neste período delicado, atua como fração, realizando atividades de defesa de alguns condenados no processo da Ação Penal 470 a eles associados, mas sem nenhuma ação de defesa do partido ou de enfrentamento dos nossos inimigos.

Acompanhamos organizações da juventude de outros partidos ocupar o espaço da JPT nos atos e mobilizações e mobilizando, inclusive, a base social que vota no PT.

Se a roda da história, como sugere Eduardo Galeano no filme Utopia e Barbárie de Silvio Tendler, é uma senhora gorda e caprichosa que se move devagar, o tempo e o espaço das disputas de geração são bem mais reduzidos e estamos vendo se consolidar uma JPT apática, burocratizada, com intervenção cada vez mais restrita as disputas eleitorais e mobilizações no congresso por políticas públicas. Bem distante do horizonte socialista e revolucionário que embalou o sonho da juventude que construiu o PT.

Precisamos refletir, travando as várias lutas que temos nesse ano, formas de retomar o curso da política que construímos até o I Congresso da JPT. Trata-se de evitar que se rompa o laço geracional entre os movimentos que deram origem ao PT há 30 anos e as lutas das novas gerações. Trata-se do presente e do futuro do PT como ferramenta de transformação para além dos governos.

Para nós jovens socialistas petistas trata-se de fazer a pergunta se queremos ou não queremos ser para a juventude o que o PT representa para a sociedade? Caso a resposta seja positiva, temos muito que fazer para nos colocarmos à frente das lutas desta geração. Temo que não possamos esperar muito dos setores moderados da juventude que não conseguem ir além de serem garotos propaganda dos nossos governos e de se ocupar em defender seus líderes condenados na AP 470. Precisamos inverter esse movimento, colocar as lutas da juventude na ordem do dia, defender o nosso partido, avançar nas reformas estruturais, dentre as quais, uma campanha pela Reforma Política que é cada vez mais urgente.

*Daniel Damiani é professor e militante da JPT/RS


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