Por Guilherme Balza
Do UOL Notícias
Em São Paulo
O Estado do Pará recebeu, nos últimos 15 anos, um título indesejado: o de campeão absoluto em assassinatos no meio rural. Entre 1996 e 2010, das 555 mortes no campo registradas em todo o país, 231 (41,6%) ocorreram no Pará, segundo relatórios da CPT (Comissão Pastoral da Terra). O Estado também está no topo do ranking de ameaças de morte, com pelo menos 30 camponeses “jurados” ao longo do ano passado.
“Todas as lideranças no Pará já receberam ameaças. É a coisa mais comum por aqui”. A afirmação é de Ulisses Manaças, 37, dirigente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) no Pará. No final de 2009, após atender ligações de um indivíduo que prometia matá-lo, o ativista registrou boletim de ocorrência e procurou o governo federal para ser incluído no programa de proteção à pessoa ameaçada.
No final de 2010, um ano após a denúncia, Manaças conta que fez uma longa entrevista com defensores públicos do Pará. “Me perguntaram tudo, o que eu fazia, qual era a proteção que eu achava necessária, quem poderia estar por trás das ameaças”, afirma. Em janeiro passado, policiais do programa foram à casa do ativista, que fica em um assentamento em Mosqueiro (a 75 km de Belém), para analisar se havia segurança no local.
Desde então, segundo o ativista, nenhuma autoridade entrou em contato. “Dizem que eu fui incluído no programa, mas nunca me notificaram ou me procuraram”, diz. Manaças relata que quase foi morto em 2002, no município de Tucuruí (a 480 km de Belém), quando um pistoleiro disparou contra ele. “Era umas 10h da noite e eu estava na rua com outro companheiro. Um homem saiu de trás de um bar, veio em nossa direção e disparou três tiros, mas não nos acertou. Corremos muito”, afirma.
A Defensoria Pública do Pará orientou a reportagem a procurar o defensor Márcio Cruz para saber se Manaças foi incluído no programa de proteção a pessoas ameaçadas de morte, mas até o início da noite ele não foi localizado. A reportagem também procurou a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, responsável pelo programa, mas não obteve uma resposta sobre as declarações do líder do MST.
O tema da violência no campo voltou à tona na semana passada, quando quatro camponeses foram mortos em menos de cinco dias. Três mortes ocorreram em Nova Ipixuna (a 625 km de Belém): o casal de castanheiros José Cláudio Ribeiro da Silva, 52, e Maria do Espírito Santo da Silva, 50, ativistas que denunciavam a ação ilegal de madeireiros, foi executado na terça-feira (24); no domingo (29), foi encontrado o corpo de Eremilton Pereira dos Santos, 25, que morava no mesmo assentamento do casal.
Na sexta-feira (27), a vítima foi Adelino Ramos, o Dinho, liderança do Movimento Camponês Corumbiara (MCC), assassinado enquanto vendia verduras em Vista Alegre do Abunã, distrito de Porto Velho (RO). Dinho foi um dos sobreviventes do massacre de Corumbiara --ocorrido em agosto de 1995, no qual pelo menos 12 pessoas morreram nas mãos de pistoleiros e PMs-- e também denunciava a atuação de madeireiros.
No Pará, a porção Sudeste concentra os conflitos fundiários e possui as mais altas taxas de homicídios em todo o país. A região, originalmente povoada por comunidades tradicionais --indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos--, sofreu um crescimento populacional nas décadas de 60 e 70, quando migrantes nordestinos chegaram ao Pará para trabalhar em grandes obras financiadas pelo governo federal, como a construção das rodovias Belém-Brasília e Transamazônica, ou para trabalhar na mineração.
Também na década de 70, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) incentivou a abertura de fronteiras agrícolas nas bordas da Amazônia, o que atraiu fazendeiros das regiões Sul e Sudeste e aumentou a grilagem [falsificação de documentos] de terras públicas. Desde então, o Sudeste paraense passou a ser cenário de conflitos pela posse da terra.
“Antes a disputa era entre camponeses e fazendeiros, criadores de gado. Hoje é com madeireiro, mineradores, é com a indústria de soja, de biodiesel”, diz o ativista. “A violência está no DNA da estrutura social fundiária brasileira. Na raiz de tudo está a disputa pelo território. Só a democratização do acesso à terra e aos bens naturais minimizará ao extremo a violência no campo”, afirma Manaças.
O líder do MST defende maior presença do poder público em áreas conflituosas. “Os crimes acontecem onde o Estado não está atuando. É preciso ampliar a presença do Estado, não só na repressão, mas nas políticas sociais, na implantação de infraestrutura.”
Manaças acredita que a aprovação das mudanças no Código Florestal deve acirrar ainda mais a disputa pela terra e os conflitos no campo. “Foi dado o aval para diminuir as áreas de reserva. A flexibilização vai provocar uma corrida pelo desmatamento na região Amazônica. Vai aumentar a grilagem de terras e a pressão sobre as comunidades tradicionais, que vivem do extrativismo”, diz.
Do UOL Notícias
Em São Paulo
O Estado do Pará recebeu, nos últimos 15 anos, um título indesejado: o de campeão absoluto em assassinatos no meio rural. Entre 1996 e 2010, das 555 mortes no campo registradas em todo o país, 231 (41,6%) ocorreram no Pará, segundo relatórios da CPT (Comissão Pastoral da Terra). O Estado também está no topo do ranking de ameaças de morte, com pelo menos 30 camponeses “jurados” ao longo do ano passado.
“Todas as lideranças no Pará já receberam ameaças. É a coisa mais comum por aqui”. A afirmação é de Ulisses Manaças, 37, dirigente do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) no Pará. No final de 2009, após atender ligações de um indivíduo que prometia matá-lo, o ativista registrou boletim de ocorrência e procurou o governo federal para ser incluído no programa de proteção à pessoa ameaçada.
No final de 2010, um ano após a denúncia, Manaças conta que fez uma longa entrevista com defensores públicos do Pará. “Me perguntaram tudo, o que eu fazia, qual era a proteção que eu achava necessária, quem poderia estar por trás das ameaças”, afirma. Em janeiro passado, policiais do programa foram à casa do ativista, que fica em um assentamento em Mosqueiro (a 75 km de Belém), para analisar se havia segurança no local.
Desde então, segundo o ativista, nenhuma autoridade entrou em contato. “Dizem que eu fui incluído no programa, mas nunca me notificaram ou me procuraram”, diz. Manaças relata que quase foi morto em 2002, no município de Tucuruí (a 480 km de Belém), quando um pistoleiro disparou contra ele. “Era umas 10h da noite e eu estava na rua com outro companheiro. Um homem saiu de trás de um bar, veio em nossa direção e disparou três tiros, mas não nos acertou. Corremos muito”, afirma.
A Defensoria Pública do Pará orientou a reportagem a procurar o defensor Márcio Cruz para saber se Manaças foi incluído no programa de proteção a pessoas ameaçadas de morte, mas até o início da noite ele não foi localizado. A reportagem também procurou a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência, responsável pelo programa, mas não obteve uma resposta sobre as declarações do líder do MST.
O tema da violência no campo voltou à tona na semana passada, quando quatro camponeses foram mortos em menos de cinco dias. Três mortes ocorreram em Nova Ipixuna (a 625 km de Belém): o casal de castanheiros José Cláudio Ribeiro da Silva, 52, e Maria do Espírito Santo da Silva, 50, ativistas que denunciavam a ação ilegal de madeireiros, foi executado na terça-feira (24); no domingo (29), foi encontrado o corpo de Eremilton Pereira dos Santos, 25, que morava no mesmo assentamento do casal.
Na sexta-feira (27), a vítima foi Adelino Ramos, o Dinho, liderança do Movimento Camponês Corumbiara (MCC), assassinado enquanto vendia verduras em Vista Alegre do Abunã, distrito de Porto Velho (RO). Dinho foi um dos sobreviventes do massacre de Corumbiara --ocorrido em agosto de 1995, no qual pelo menos 12 pessoas morreram nas mãos de pistoleiros e PMs-- e também denunciava a atuação de madeireiros.
No Pará, a porção Sudeste concentra os conflitos fundiários e possui as mais altas taxas de homicídios em todo o país. A região, originalmente povoada por comunidades tradicionais --indígenas, quilombolas, extrativistas e ribeirinhos--, sofreu um crescimento populacional nas décadas de 60 e 70, quando migrantes nordestinos chegaram ao Pará para trabalhar em grandes obras financiadas pelo governo federal, como a construção das rodovias Belém-Brasília e Transamazônica, ou para trabalhar na mineração.
Também na década de 70, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) incentivou a abertura de fronteiras agrícolas nas bordas da Amazônia, o que atraiu fazendeiros das regiões Sul e Sudeste e aumentou a grilagem [falsificação de documentos] de terras públicas. Desde então, o Sudeste paraense passou a ser cenário de conflitos pela posse da terra.
“Antes a disputa era entre camponeses e fazendeiros, criadores de gado. Hoje é com madeireiro, mineradores, é com a indústria de soja, de biodiesel”, diz o ativista. “A violência está no DNA da estrutura social fundiária brasileira. Na raiz de tudo está a disputa pelo território. Só a democratização do acesso à terra e aos bens naturais minimizará ao extremo a violência no campo”, afirma Manaças.
O líder do MST defende maior presença do poder público em áreas conflituosas. “Os crimes acontecem onde o Estado não está atuando. É preciso ampliar a presença do Estado, não só na repressão, mas nas políticas sociais, na implantação de infraestrutura.”
Manaças acredita que a aprovação das mudanças no Código Florestal deve acirrar ainda mais a disputa pela terra e os conflitos no campo. “Foi dado o aval para diminuir as áreas de reserva. A flexibilização vai provocar uma corrida pelo desmatamento na região Amazônica. Vai aumentar a grilagem de terras e a pressão sobre as comunidades tradicionais, que vivem do extrativismo”, diz.
0 Response to "MST: "Todas as lideranças no Pará já foram ameaçadas de morte""
Postar um comentário