Iriny Lopes: Autonomia econômica é fundamental para diminuir violência contra as mulheres

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Entrevista concedida a Luciana Lima* da Agência Brasil:


“Eu acho que a eleição da presidente Dilma vai estimular 
uma participação maior na política por parte das mulheres”


Só o empoderamento nos níveis econômico e político conseguirá propiciar às mulheres brasileiras uma situação de maior igualdade em relação aos homens. Para a nova ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Iriny Lopes, as políticas do governo devem ter foco nesses dois aspectos para combater a violência sofrida pelas mulheres.

“Eu acho que a eleição da presidente Dilma vai estimular uma participação maior na política por parte das mulheres”, acredita Iriny que foi reeleita para seu terceiro mandato na Câmara dos Deputados, mas decidiu deixar a vaga para assumir a secretaria a convite de Dilma.
Iriny também é a titular da Secretaria de Relações Internacionais do Partido dos Trabalhadores.
Leia a íntegra da entrevista da ministra concedida à Agência Brasil:

Os dados da última Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílios, a Pnad, do IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística], demonstraram que as mulheres já estão à frente de quase 22 milhões de residências brasileiras. Além disso, em 2009, enquanto o número de homens apontados na pesquisa como “referência na família” subiu 1,8%, o número de mulheres cresceu 3% em comparação a 2008. Diante dessa realidade brasileira, que políticas públicas se tornam estratégicas para o governo nesse momento?

As políticas necessárias para enfrentar um quadro dessa natureza, obviamente, dizem respeito a criar condições para que as mulheres possam adquirir autonomia econômica, ampliar a sua participação no mercado de trabalho e melhorar efetivamente a sua renda. É preciso agregar algumas políticas sociais no sentido de dar garantia para que a família, em especial os filhos dependentes dessas mães, tenham assistência garantida, como creches, alimentação correta, e uma escola que possa recebê-los. Isso vai fazer com que esse conjunto de mulheres que cada dia se amplia mais no Brasil possa ser incorporado à produção, possa ser incorporado ao mercado de trabalho, possa garantir a sua autonomia econômica e, com isso, se firmar como cidadã com todos os seus direitos e garantias.

A mesma pesquisa demonstrou que 25% das mulheres brasileiras ainda são vítimas de violência por parte de seus companheiros ou ex-companheiros. Como assegurar a eficácia da Lei Maria da Penha, que pune com mais rigor esse tipo de violência?

Nosso objetivo central é fazer com que o pacto da não violência, que é um dos principais programas conduzidos pela Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República, seja efetivamente ampliado e que as prefeituras e governos de estados tenham as condições efetivas de aplicação, para que lá na ponta, as mulheres sejam atendidas. Além disso, obviamente, é necessária uma boa articulação com o Judiciário e o Ministério Público no sentido do cumprimento estrito da Lei Maria da Penha para, com isso, efetivarmos no Brasil uma redução da violência praticada contra as mulheres.

Mas muitas mulheres ainda deixam de denunciar por medo de sofrer novas violências. Isso não requer do Estado órgãos e ações mais capazes de proteger essa mulher?

O cumprimento da Lei Maria da Penha e os investimentos nas casas de passagem, nas casas abrigo são fundamentais. Mas tem duas outras questões que são complementares e indispensáveis. Uma delas é a autonomia econômica das mulheres. Muitas mulheres não fazem a denúncia porque são dependentes dos seus companheiros, ou dos familiares, pais ou irmão, que são arrimo e que a sustentam. Então, a autonomia econômica da mulher a coloca em um outro patamar. A outra questão é a informação, é a mudança de postura, é a cultura, que dê a mulher conhecimento suficiente sob os seus direitos e a quem procurar para assegurar esses direitos. A combinação de mais investimentos no acolhimento da mulher vítima de violência, a ela e a seus filhos, a autonomia econômica, e uma mudança de postura a partir do conhecimento dos seus direitos são fatores indispensáveis para que a gente possa enfrentar com êxito a redução da violência praticada contra a mulher.

A senhora acredita em posições divergentes da presidenta eleita, Dilma Rousseff, em relação a questão do aborto? Durante a campanha, Dilma revelou ser pessoalmente contra o aborto. Qual é a sua posição pessoal e que políticas cabe ao governo desenvolver em relação a esse assunto?

As políticas do governo já estão expressas pela presidenta Dilma durante a campanha. Será cumprida a lei que garante que as mulheres não serão vítimas de sequelas ou vítimas fatais em função da questão do aborto. A posição da presidenta é uma posição de natureza pessoal que a gente respeita, assim como queremos respeitar todas as posições. Esse é um tema polêmico, em lugar nenhum do mundo ele é tranquilo. São pontos de vista diferentes. Algumas pessoas tratam essa questão a partir das suas convicções religiosas, outros tratam a partir da saúde pública. A minha opinião pessoal é que cabe à mulher decidir. Cabe à mulher decidir se ela está em condições, se ela quer, se ela deseja prosseguir com essa gravidez. Então, eu acho que isso precisa ser respeitado.

A legislação sobre adoção no país não reconhece casais homossexuais como capazes de adotar uma criança. Isso afeta diretamente as mulheres lésbicas. Qual é a posição da senhora sobre essa possibilidade e como o Poder Executivo pode influenciar para mudanças na legislação?

Eu acho que uma criança precisa de estabilidade, afeto e cuidados, carinho. Precisa de cuidados físicos, materiais, psicológicos, e não há nenhum lugar que comprove que um casal LGBT [lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais] não possa cumprir com esses parâmetros. Eu acho que é direito deles fazer a adoção e é direito das crianças ter um lar. Essa é uma questão muito mais pertinente ao debate no Congresso do que propriamente no Executivo porque o Executivo não pode lançar programas que não estejam amparados por leis, aprovados em pleno vigor. Mas todo programa anti-homofóbico que o governo federal, nos dois governos do presidente Lula, já executa ajuda a ampliar as possibilidades de uma legislação que garanta essas adoções venha a prevalecer no Brasil.

O Poder Legislativo tem dado respostas muito lentas em relação a essa questão. O Poder Judiciário tem, inclusive, legislado na medida em que concede essas adoções e o Poder Executivo acaba indo à reboque do Legislativo. Há como ter uma celeridade maior na discussão dessas questões no Congresso ou a senhora, até como parlamentar, ainda considera que é uma questão tabu para se discutir no Congresso?

O Congresso brasileiro reflete a sociedade brasileira. Os diversos pensamentos que permeiam a sociedade é que acabam sendo responsáveis por essa lentidão nos processos de decisão porque há os que são a favor e os que são contrários e cada grupo acaba puxando mais para o lado que está convencido de que é o melhor e isso acaba enterrando o processo de debate na Câmara. Eu acho que a sociedade precisava se movimentar mais, porque o Congresso brasileiro é movido por isso, obviamente, e não podia ser diferente. Isso é que ajudaria o Congresso a ter mais celeridade. Obviamente eu não estou me referindo a manter regras atuais da tramitação dos projetos dentro da Câmara.

Embora o Brasil tenha elegido uma mulher como presidenta, a participação feminina ainda guarda muita desigualdade em relação aos homens. Após a eleição do último dia 3, a bancada feminina na Câmara dos Deputados encolheu de 47 para 43 integrantes. Um número baixo num universo de 513 deputados. A bancada feminina no Senado terá 12 mulheres a partir de 2011 num contexto de 81 senadores. Além disso, mulheres no comando das duas Casas são raridade ou inexistem, como é o caso da Câmara. O que que é necessário fazer para mudar essa realidade no Brasil?

Eu acho que a eleição da presidente Dilma vai estimular uma participação maior por parte das mulheres. Agora, as mulheres não participam mais por uma ausência de condições objetivas para que elas possam atuar na política. Ainda prevalece no Brasil a ideia de que a administração da casa, a condução da família, a administração da vida escolar e a manutenção e o acompanhamento da vida de saúde dos filhos é obrigação da mulher. Então, a mulher fica presa. No campo das eleições, é muito mais difícil. Eu falo como uma pessoa que já tem estrada. Eu vou assumir a Secretaria de Políticas para as Mulheres mas fui reeleita deputada federal pelo terceiro mandato, sei o quanto é difícil o financiamento de campanhas para mulheres. Nós temos muito mais dificuldade de financiamento do que os homens. Isso precisa ser alterado para que a gente possa ter condições de uma participação equânime na vida política e no empoderamento das mulheres. Entre homens e mulheres essas barreiras precisam cair.

Fonte: Agência Brasil
*Luciana Lima é repórter da Agência Brasil


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