por Marcelo
Zero
Ao contrário de alguns,
não sinto nenhuma vergonha do meu país
Não sinto vergonha dos
36 milhões de brasileiros que conseguiram sair da pobreza extrema, graças a
programas sociais como o Bolsa Família. Na realidade, me alegro muito disso.
Sei que eles se libertaram daquilo que Gandhi chamava de a “pior forma de
violência”, a miséria. Agora, eles podem sonhar mais e fazer mais. Tornaram-se
cidadãos mais livres e críticos. Isso é muito bom para eles e muito melhor para
o Brasil, que fica mais justo e fortalecido. E isso é também muito bom para
mim, embora eu não me beneficie diretamente desses programas. Me agrada viver
em um país que hoje é um pouco mais justo do que era no passado.
Também não sinto vergonha
dos 42 milhões de brasileiros que, nos últimos 10 anos, ascenderam à classe
média, ou à nova classe trabalhadora, como queiram. Eles dinamizaram o mercado
de consumo de massa brasileiro e fortaleceram bastante a nossa economia. Graças
a eles, o Brasil enfrenta, em condições bem melhores que no passado, a pior
crise mundial desde 1929. Graças a eles, o Brasil está mais próspero, mais
sólido e menos desigual. Ao contrário de alguns, não me ressinto dessa
extraordinária ascensão social. Sinto-me feliz em tê-los ao meu lado nos
aeroportos e em outros lugares antes reservados a uma pequena minoria. Sei que,
com eles, o Brasil pode voar mais alto.
Não tenho vergonha
nenhuma das obras da Copa, mesmo que algumas tenham atrasado. Em sua maioria,
são obras que apenas foram aceleradas pela Copa. São, na realidade, obras de
mobilidade urbana e de aperfeiçoamento geral da infraestrutura que melhorarão a
vida de milhões de brasileiros. Estive no aeroporto de Brasília e fiquei muito
bem impressionado com os novos terminais e com a nova facilidade de acesso ao
local. Mesmo os novos estádios, que não consumiram um centavo sequer do
orçamento, impressionam. Lembro-me de velhos estádios imundos, inseguros, desconfortáveis
e caindo aos pedaços. Me agrada saber que, agora, os torcedores vão ter a sua
disposição estádios decentes. Acho que eles merecem. Me agrada ainda mais saber
que tido isso vem sendo construído com um gasto efetivo que representa somente
uma pequena fração do que é investido em Saúde e Educação. Gostaria, é claro,
que todas as obras do Brasil fossem muito bem planejadas e executadas. Que não
houvesse aditivos, atrasos, superfaturamentos e goteiras. Prefiro, no entanto,
ver o Brasil em obras que voltar ao passado do país que não tinha obras estruturantes,
e tampouco perspectivas de melhorar.
Tranquiliza-me saber
que o Brasil tem um sistema de saúde público, ainda que falho e com grandes
limitações. Já usei hospitais públicos e, mesmo com todas as deficiências do
atendimento, sai de lá curado e sem ter gasto um centavo. Centenas de milhares
de brasileiros fazem a mesma coisa todos os anos. Cerca de 50 milhões de
norte-americanos, habitantes da maior economia do planeta e que não têm plano
de saúde, não podem fazer a mesma coisa, pois lá não há saúde pública. Obama, a
muito custo, está encontrando uma solução para essa vergonha. Gostaria, é
óbvio, que o SUS fosse igual ao sistema de saúde pública da França ou de Cuba.
Porém, sinto muito orgulho do Mais Médicos, um programa que vem levando atendimento
básico à saúde a milhões de brasileiros que vivem em regiões pobres e muito
isoladas. Sinto alívio em saber que, na hora da dor e da doença, agora eles vão
ter a quem recorrer. Sinto orgulho, mas muito orgulho mesmo, desses médicos que
colocam a solidariedade acima da mercantilização da medicina.
Estou também muito
orgulhoso de programas como o Prouni, o Reuni, o Fies, o Enem e os das cotas,
que estão abrindo as portas das universidades para os mais pobres, os
afrodescendentes e os egressos da escola pública. Tenho uma sobrinha
extremamente talentosa que mora no EUA e que conseguiu a façanha de ser aceita,
com facilidade, nas três melhores universidades daquele país. Mas ela vai ter de estudar numa universidade
de segunda linha, pois a família, muito afetada pela recessão, não tem condição
de pagar os custos escorchantes de uma universidade de ponta. Acho isso uma
vergonha. Não quero isso para o meu país. Alfabetizei-me e fiz minha graduação
e meu mestrado em instituições públicas brasileiras. Quero que todos os
brasileiros possam ter as oportunidades que eu tive. Por isso, aplaudo a
duplicação das vagas nas universidades federais, a triplicação do número de
institutos e escolas técnicas, o Pronatec, o maior programa de ensino
profissionalizante do país, o programa de creches e pré-escolas e o Ciência Sem
Fronteiras. Gostaria, é claro, que a nossa educação pública já fosse igual à da
Finlândia, mas reconheço que esses programas estão, aos poucos, construindo um
sistema de educação universal e de qualidade.
Tenho imenso orgulho da
Petrobras, a maior e mais bem-sucedida empresa brasileira, que agora é vergonhosamente
atacada por motivos eleitoreiros e pelos interesses daqueles que querem botar a
mão no pré-sal. Nos últimos 10 anos, a Petrobras, que fora muito fragilizada e
ameaçada de privatização, se fortaleceu bastante, passando de um valor de cerca
de R$ 30 bilhões para R$ 184 bilhões. Não bastasse, descobriu o pré-sal, nosso
passaporte para o futuro. Isso seria motivo de orgulho para qualquer empresa e
para qualquer país. Orgulha ainda mais, porém, o fato de que agora, ao
contrário do que acontecia no passado, a Petrobras dinamiza a indústria naval e
toda a cadeia de petróleo, demandando bens e serviços no Brasil e gerando emprego
e renda aqui; não em Cingapura. Vergonha era a Petrobrax. Pasadena pode ter
sido um erro de cálculo, mas a Petrobrax era um crime premeditado.
Vejo, com satisfação,
que hoje a Polícia Federal, o Ministério Público, a CGU e outros órgãos de
controle estão bastante fortalecidos e atuam com muita desenvoltura contra a corrupção
e outros desmandos administrativos. Sei que hoje posso, com base na Lei da Transparência,
demandar qualquer informação a todo órgão público. Isso me faz sentir mais
cidadão. Estamos já muito longe da vergonha dos tempos do “engavetador-geral”.
Um tempo constrangedor e opaco em que se engavetavam milhares processos e não
se investigava nada de significativo.
Também já se foram os idos
vergonhosos em que tínhamos que mendigar dinheiro ao FMI, o qual nos impunha um
receituário indigesto que aumentava o desemprego e diminuía salários. Hoje,
somos credores do FMI e um país muito respeitado e cortejado em nível mundial. E
nenhum represtante nosso se submete mais à humilhação de ficar tirando sapatos
em aeroportos. Sinto orgulho desse país mais forte e soberano.
Um país que, mesmo em
meio à pior recessão mundial desde 1929, consegue alcançar as suas menores
taxas de desemprego, aumentar o salário mínimo em 72% e prosseguir firme na
redução de suas desigualdades e na eliminação da pobreza extrema. Sinto alegria
com esse Brasil que não mais sacrifica seus trabalhadores para combater as
crises econômicas.
Acho que não dá para
deixar de se orgulhar desse novo país mais justo igualitário e forte que está
surgindo. Não é ainda o país dos meus sonhos, nem o país dos sonhos de ninguém.
Mas já é um país que já nos permite sonhar com dias bem melhores para todos os
brasileiros. Um país que está no rumo correto do desenvolvimento com
distribuição de renda e eliminação da pobreza. Um país que não quer mais a
volta dos pesadelos do passado.
Esse novo país mal
começou. Sei bem que ainda há muito porque se indignar no Brasil. E é bom
manter essa chama da indignação acessa. Foi ela que nos trouxe até aqui e é ela
que nos vai levar a tempos bem melhores. Enquanto houver um só brasileiro
injustiçado e tolhido em seus direitos, todos temos de nos indignar.
Mas sentir vergonha do
próprio país, nunca. Isso é coisa de gente sem-vergonha.
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