Pretendia escrever um texto de avaliação sobre as Marchas da Liberdade em todo Brasil quando vi este artigo na rede ["A esquerda fora do eixo", publicado dia 17 de Junho de 2011 no site Passa a Palavra com assinatura coletiva ] sintomático da perplexidade de certos setores da esquerda tradicional com as mudanças e crise do capitalismo fordista e as novas dinâmicas de resistência e criação dentro do chamado capitalismo cognitivo (pós-fordista, da informação ou cultural).
Crise e desestruturação que tem como horizonte a universalização dos meios de produção e infra-estrutura pública instalada, a constituição de novos circuitos e mercados e a emergência de uma intelectualidade de massa (não mais o “proletariado”, mas o cognitariado) com a possibilidade da apropriação tecnológica por diferentes grupo (software livre, códigos abertos, cultura digital).
Crise e paradoxo onde o próprio crescimento gera e multiplica precariedade, mas também novas dinâmicas e modelos.
O capitalismo da “abundância” produz crise ao entrar no horizonte da gratuidade/compartilhamento/colaboração com uma mutação da própria idéia de “propriedade” (ver a crise do Direito Autoral).
O texto percebe as mudanças, estruturais, mas não consegue ir além nas conseqüências e funciona como uma caricatura que busca demonizar as novas dinâmicas sociais e culturais pós-fordistas e despotencializar a cultura digital, o midiativismo e as estratégias de apropriação tecnológicas das redes, inclusive a apropriação de ferramentas como o Facebook, twitter e outras para causas e objetivos próprios, como fizeram os árabes e os espanhóis, hackeando as novas corporações pós-fordistas.
Falta ao texto (além de diagnósticos equivocados sobre a “nova classe dominante”) um arsenal teórico minimamente a altura das mutações, crises e impasses do próprio capitalismo.
Há uma frase sintomática neste artigo que me chamou atenção e que esclarece em muito sobre “quem” fala e de “onde” fala sob a assinatura anônima/coletiva:
Diz: “é praticamente impossível para um observador desatento ou viciado nas velhas estruturas identificar e combater o novo sujeito formado por este coletivo (ou rede).”, referindo-se ao Circuito Fora do Eixo a quem os autores atribuem _ numa teoria “conspiratória” que não esconde uma envergonhada admiração_ praticamente tudo o que está acontecendo de mais interessante na cena do ativismo brasileiro!
A frase explicita o medo diante das novas dinâmicas que estão sendo inventadas e experimentadas “fora do eixo” da esquerda clássica, criando experiências e conceitos que explodem o arsenal de teorias maniqueístas fordistas de uma esquerda pautada pelo capitalismo do século XX, incapaz de enxergar as “revoluções do capitalismo”, dentro “do” capitalismo e que vem sendo discutidas pelo menos desde maio de 68 ou logo depois quando, por exemplo, os teóricos-ativistas Gilles Deleuze e Félix Guattari lançaram o extraordinário manifesto “O Anti-Édipo ou Capitalismo e Esquizofrenia”, de 1972. Ou que ignora as análises sobre as mutações do capitalismo tematizadas por um teórico comunista como Antonio Negri, nos livros “Império” e “Multidão”, dois clássicos contemporâneos.
A frase dá bem a dimensão desse medo e incompreensão do novo e aponta a própria incapacidade de ver dos autores do artigo.
O observador “viciado nas velhas estruturas” é exatamente “quem fala” neste texto, que também se entrega, medroso e preocupado, com a perda do seu próprio protagonismo. Perda de toda uma esquerda fordista que funciona hoje como a “vanguarda da retaguarda” mais conservadora até que muitas dinâmicas do próprio mercado!
Entre os problemas mais gritantes destaco:
Com todo o respeito, que texto mais pretensioso!. Autora e prolixa e abusa de expressão 'fordista' rendendo uma cognição estéril e confusa. Não é tão difícil identificar e estabelecer uma conexão filosófica entre as diversas gerações que expressam suas próprias circunstâncias na dinâmica viva das transições quando estabelecidas numa plataforma dialética. Não precisava ser esse 'bicho Grilo' todo. Ainda bem que não foi escrito em japonês e traduzido em braile.
ResponderExcluirNa verdade, a reconstrução da memória histórica com base na experiência e nas convicções do presente é um fenômeno sociológico. Sempre quando os povos transitam de uma fase para outra da história, e quando a seguinte rejeita taxativamente a anterior, há problemas de memória, resolvidos por reconstruções mais ou menos elaboradas, quando não pelo puro e simples esquecimento.
ResponderExcluirDaniel Aarão Reis,