Terruá Pará: marketing não é sinônimo de cultura

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por Edir Gaya

Carlos Eduardo Miranda e Cyz Moreno, produtores que se notabilizaram em programas de “caça-talentos” da TV brasileira, são agora os que ditam a música paraense que os brasileiros vão ouvir. Foram eles que selecionaram os músicos convidados ao Terruá Pará, todos eles sem dúvida de talento inquestionável, como centenas de outros que nem tiveram a oportunidade de participar da seleção. O governo alega que se trata de uma política pública, que receberá dos cofres do Estado R$ 3 milhões ao longo de quatro anos, ou seja, R$ 750 mil ao ano.

Salta aos olhos, porém, evidência do caráter privatista da iniciativa, que aplica dinheiro público sem nenhum dos critérios básicos estabelecidos em Lei para o uso de verbas do Erário: legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade e probidade administrativa.

Os critérios de seleção foram balizados apenas pelo mercado de música pop e pelos interesses promocionais dos patrocinadores, conforme deixa evidente a escolha dos produtores responsáveis pela seleção dos músicos convidados. O Terruá Pará é na verdade uma iniciativa que se esgota no marketing, embora o governo do Estado queira dar-lhe um caráter de política cultural.

Há que se questionar o fato de o projeto ter sido levado para São Paulo, ao Ibirapuera, sob a alegação de que se trata de uma política de circulação da música e da cultura paraense, quando, mesmo na capital, houve apenas três apresentações no Margarida Schivasappa, polêmicas inicialmente por causa da cobrança de ingressos e depois, quando o governo mudou de ideia, pela distribuição restrita dos bilhetes gratuitos para assessores e outras pessoas ligadas ao governo, o que gerou uma série de protestos nas redes sociais.

Ora, a pergunta que não quer calar é: ante a iminência de um plebiscito para esfacelar o Estado, criando duas outras unidades federativas em território paraense, é justo aplicar-se R$ 750 mil ao ano em um evento de marketing pensado para um pretenso público de São Paulo, com três apresentações restritas em Belém, quando há todo um estado sequioso por conhecer a música e a cultura produzidas nos seus mais diferentes recantos?

Agora mesmo, em Marabá, as atrações locais do Festival da Canção de Marabá (Fecam) mostraram o equívoco da falta de seleção pública ao Terruá, deixando de mostrar ao País o talento de grandes músicos daquela região, entre os quais cito o guitarrista Antônio Coelho Neto, que representa de forma significativa a excelência do conjunto de músicos do sul e sudeste do Pará. O oeste do Estado também perdeu a chance de mostrar outros talentos, afora o consagrado Sebastião Tapajós. Por outro lado, a presidente da Funtelpa, jornalista Adelaide Oliveira, a quem reputo como uma pessoa da maior seriedade, informou recentemente nas redes sociais que os shows em São Paulo custaram R$ 550 mil.

É preciso minudenciar esses gastos, quanto receberam os artistas, quanto foi pago aos produtores, o que foi gasto nas transmissões etc, e comparar com outras manifestações de massa da música paraense, de grande alcance não apenas cultural, mas social e ambiental, como o Boi Pavulagem por exemplo, uma das maiores expressões culturais envolvendo música no Estado (também excluído do Terruá) e que, além das atividades educativas em bairros periféricos da capital e do interior, mantém seis arrastões anuais nos meses de fevereiro, junho e outubro.

É preciso ficar claro que não se é contra projeto algum que venha a promover a música e a cultura do Pará, mas não se pode permitir que em nome de boas intenções se use dinheiro público em eventos promocionais que, por falta de observância das normas legais, resultem na apropriação privada de recursos públicos. Política pública exige necessariamente a salvaguarda dos editais e a observância dos critérios de legalidade, impessoalidade, moralidade, igualdade, publicidade e probidade administrativa.


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