Desafios para o PT e para a esquerda no próximo período

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  por Egon Krakhecke*

Agradecendo o honroso convite para contribuir à Tribuna de Debates, preparatória ao Congresso da AE, vou  abordar dois desafios que me parecem relevantes para o PT e a esquerda brasileira enfrentarem no período que se avizinha:

i) qual é, afinal, nosso Projeto Estratégico, que possa balizar nossa atuação no governo e na sociedade?

ii) qual a nossa estratégia para acumular forças e mudar efetivamente a correlação de forças na sociedade, com vistas a dar sustentação ao nosso Projeto Estratégico?

No que respeita ao primeiro desafio, lembro que o PT nasceu com uma clara proposta socialista. Passadas três décadas, acumulou o partido notáveis avanços na via institucional, de que dão conta os dois mandatos de Lula e o novo mandato conquistado com Dilma. Inegavelmente, melhoraram muito, nestes últimos
oito anos, as condições de vida do povo brasileiro, em especial dos mais pobres. Ademais, em meio a uma crise global, tem nosso governo sido capaz de apontar para o Brasil um claro caminho de crescimento vigoroso de sua economia, de crescimento econômico com inclusão social. O balanço que o governo
Lula preparou desses oito anos aponta o nítido avanço ocorrido, quando confrontado com a gestão FHC.

A pergunta que se faz é: se avançamos em relação ao passado, temos também uma avaliação sobre qual foi nosso avanço em direção ao futuro desejado? Qual futuro desejado? A questão suscitada nos remete, de imediato, à questão de nosso Projeto Estratégico, de onde queremos chegar no longo prazo. Qual o tipo de sociedade que desejamos alcançar? Nosso projeto continua socialista, como está inscrito no estatuto (“construir o socialismo democrático”)? Ou é social-democrata? Ou, ainda, é o de modernizar e civilizar
nosso capitalismo “selvagem”? Nossas discussões sobre o futuro têm se cingido, quase invariavelmente e quando muito, aos programas de governo, ou seja, ao prazo de quatro anos que dura um mandato.

Contudo, precisamos de um termo de referência mais longo, que nos balize para onde estamos indo e que, confrontado com nossos balanços de gestão e nossos programas de governo, nos permita avaliar se estamos caminhando no rumo certo e se, em cada etapa de nossa jornada, estamos efetivamente avançando na construção de nosso projeto de sociedade.

Compulsando os documentos do PT, me deparo com dificuldade para encontrar algo como um Programa ou Projeto Estratégico para referenciar nossa luta e nossa atuação no governo e na sociedade. No livro de documentos resultantes do 3º Congresso do partido, realizado em 2007, encontrei um tópico sob o título de Projeto de Desenvolvimento Nacional, com menos de duas páginas, muito genérico para servir como a referência de longo prazo aqui defendida.

No âmbito do governo federal (e, também, dos estados e municípios) lida-se com dois instrumentos principais de planejamento: o orçamento anual e o PPA, de curto e médio prazos. Não há, também, o referencial de longo prazo. Ressalve-se, contudo, que, a pedido do presidente Lula, a SAE (Secretaria
de Assuntos Estratégicos da Presidência da República) coordenou, recentemente, a elaboração do Projeto BR 2022, uma primeira tentativa interessante de estabelecer um farol de longo prazo para a atuação do conjunto do setor público.

Identifico, pois, na falta de um Projeto Estratégico de Sociedade e de Estado um desafio a ser enfrentado pelo PT. Um Projeto que seja, também, capaz de compatibilizar as distintas dimensões do desenvolvimento, sem que uma dimensão (como a econômica) subordine as demais dimensões (como a dimensão
socioambiental) à sua lógica. Isto requer o resgate da capacidade partidária de refletir sobre seu rumo e trajetória.

O segundo desafio aqui proposto, nos remete à necessidade de refletir sobre a sustentação política que fomos e seremos capazes de construir para viabilizar a implantação de nosso Projeto Estratégico. Ou seja, modificamos e quanto modificamos, efetivamente, a correlação de forças na sociedade a favor de nosso projeto? Com quem vamos caminhar? O que pensamos fazer, nos próximos quatro anos, para acumular mais forças? Para tanto, que papel deve cumprir o espaço institucional conquistado pelo PT e pela esquerda em
geral? Qual o papel da luta e dos movimentos sociais? O que pode e deve o PT fazer a respeito?

Antigamente, ouvíamos dizer que as contradições e a luta de classes constituíam o motor da história. Hoje quase inexiste o necessário diálogo entre a reflexão e a prática, excessivamente absorvidos que estamos com
o fazer e submetidos à lógica de governo. Assim, nos comportamos mais como se as contradições entre as classes sociais tivessem desaparecido. Parece que nos conformamos com os limites da institucionalidade burguesa. Pegamos gosto pelos mandatos e pelos espaços institucionais, como se as contradições profundas de nosso sistema capitalista pudessem ser resolvidas nos limites da democracia representativa, nos parlamentos, onde prevalecem, quase sempre, os interesses da elite.

Não é meu propósito negar a importância da via institucional para fazer avançar nosso projeto. Não posso, contudo, deixar de registrar a limitação que esta via representa, sobretudo, se desacompanhada do fortalecimento da luta social. Os avanços na via institucional estão freados pela forte influência do poder econômico e são sujeitos a soluços, à descontinuidade, decorrentes da rotatividade imposta pelo processo eleitoral. Isto torna mais imperiosa a necessidade de fazer avançar a luta social, de construir um novo protagonismo social. É ela, tanto quanto ou mais que o avanço institucional, que pode nos assegurar maior sustentabilidade para fazer avançar a construção e a consolidação de nosso Projeto Estratégico.
Temos, não obstante, dado mais atenção ao espaço institucional do que à disputa da hegemonia ideológica e política no seio da sociedade. O avanço conquistado no caminho do tapete dificilmente resiste sem um sólido
avanço no caminho da rua. Neste sentido, me parece, temos confiado demais no pacto com setores da burguesia, como se a burguesia pudesse ser nosso aliado estratégico. Nossos aliados estratégicos são os setores populares explorados e subalternizados pelo capitalismo.

O equívoco tem nos custado, inclusive, sustos nas eleições, como agora, em outubro. Amplos setores da burguesia travam, permanentemente, o embate ideológico com a esquerda e aguçam o confronto nos momentos de eleição, não se pejando de recorrerem ao preconceito e à mentira. Na verdade, a burguesia,
enquanto classe, quer nos ver pelas costas. Assim, a definição de um Projeto Estratégico de Sociedade e de Estado e a nossa estratégia para mudar, a favor de nosso projeto, a correlação de forças na sociedade são temas estreitamente ligados e que, a meu ver, constituem dois desafios, entre outros tantos, para o PT e a esquerda brasileira enfrentarem no próximo período. Se é que o partido ainda aspira disputar e hegemonizar um projeto de futuro para o Brasil, nos marcos do socialismo democrático, como prescreve nosso estatuto.
Em síntese, se queremos saltar da condição de 8ª economia para a condição de 5ª economia mundial, em 2014, a pergunta que se impõe é: para quem e com quem?

*Egon é militante do PT do Mato Grosso do Sul


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