Nas investigações policiais, o processo mais comum para deslindar crimes consiste em descobrir o motivo, ou os motivos. Em outras palavras, simplesmente começar pela pergunta “a quem interessa?”.
Aliás, esta parece ser a pergunta que o povão está se fazendo diante da denúncia da campanha Serra sobre o suposto envolvimento da candidata Dilma na obtenção de dados sigilosos da filha e de correligionários do tucano-pefelista.
Como uma candidata, que está mais de 20 pontos na frente de seu concorrente, e periga ganhar no primeiro turno, pode ter interesse numa operação desse tipo? E, para fazer o quê? Numa situação de tal vantagem, somente alguém totalmente estúpido poderia cometer um erro tão grande. Portanto, não é preciso ser um luminar de inteligência para chegar à conclusão de que a candidata Dilma não tem interesse ou motivo algum para cometer um crime como esse.
Por outro lado, o mesmo não se pode dizer da campanha do candidato Serra. Não deixa de ser suspeito que sua denúncia tenha aparecido logo após as pesquisas de opinião haverem indicado que as preferências eleitorais em torno de seu nome estavam em queda livre, enquanto a candidata petista apresentava uma tendência de ascensão.
Também não deixa de ser suspeito que o próprio candidato tucano-pefelista tenha se apressado a dizer, com a certeza de quem conhece o fio da meada, que o PT e a ex-ministra Dilma eram os responsáveis pela suposta quebra do sigilo de sua filha. No jargão popular, isso se parece muito com a história do ladrão que, para escapar da perseguição, se torna a principal voz nos gritos de “pega ladrão”.
O histórico do candidato Serra, nesses tipos de armação, também é público e notório. O que parece lhe haver rendido inimigos históricos, como o ex-presidente Sarney e sua filha Roseana, envolvidos num rumoroso caso policial no Maranhão, cuja origem teima em apontar para o ex-governador de São Paulo. Algo idêntico parece haver ocorrido na disputa entre os pré-candidatos tucanos ao governo de São Paulo, em 2006, na qual o pré-candidato Alckmin saiu razoavelmente chamuscado por denúncias anônimas.
A descoberta de que a fraude na assinatura da petição dos dados da filha do candidato Serra à Receita Federal (até agora não se sabe se os dados foram realmente obtidos) foi cometida por um contador de Mauá, filiado ao PT, em 2003, permanece nebulosa. Ela parece tanto com descoberta das “provas” plantadas pelos órgãos repressivos da ditadura militar para incriminar seus prisioneiros quanto com a “compra” de serviços de pessoas dispostas a cometer vilanias por algum dinheiro. Na história das eleições brasileiras, jamais se deve esquecer o caso Lurian como um paradigma nesse comércio de ações vis.
Na situação atual, para piorar, a evidência do desespero diante do espaço aberto pela candidatura Dilma sobre seu concorrente aponta este último como único interessado. Apenas ele tem motivos para criar um fato político desse tipo, mesmo tenebroso, para reverter o processo. Nessas condições, se a polícia fizer um bom perfil dos envolvidos e dos interesses de cada um, ela provavelmente deslindará a trama com certa rapidez.
Por outro lado, essa ação também traz à luz o que realmente está em disputa. E acaba com as ilusões daqueles que achavam possível realizar uma disputa eleitoral civilizada e não se prepararam para uma ocasião como essa.
A vitória do PT e Dilma, mesmo numa coalizão que inclui agrupamentos políticos de direita, representará um acerto de contas fatal para qualquer soerguimento da ideologia e das políticas neoliberais. Elas até continuarão existindo, mas sua expressão política como direita reacionária se verá obrigada a uma reestruturação para a qual não se preparou, abrindo chances para um avanço ainda maior das políticas democráticas e populares do governo.
O impacto da derrota da direita reacionária, cuja expressão é a coalizão PSDB-PFL (DEM é só para quem não sabe do engano), também será fatal para aqueles setores da esquerda que se aliaram a essa direita, formal ou informalmente, mesmo fingindo supostamente ter saído pela esquerda contra o governo Lula. Não por acaso a candidata Marina se apressou, afoitamente, a responsabilizar o governo pela fraude na assinatura da filha do candidato tucano-pefelista. Ao invés de uma candidata independente, pareceu, cada vez mais, uma voz ou um braço auxiliar do tucanato, numa trama suja da qual não precisava participar.
Wladimir Pomar é escritor e analista político
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